DOMÍNIO PRÓPRIO

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DOMÍNIO PRÓPRIO

Aquele menino tinha um temperamento difícil, explosivo, vivia brigando, discutindo, se desentendo com os amigos, sempre de mau humor e respondendo mal aos pais e professores. Um dia, quando estava em seu quarto, ficou surpreso com seu pai abrindo a porta e trazendo um pacote nas mãos. Será um presente? pensou intrigado e um pouco confuso, pois afinal nada havia feito de bom, e nem era seu aniversário… Mas ansioso foi na direção do pai, que lhe entregou o embrulho, mais que depressa aberto por ele. Surpresa! Era um saco plástico cheio de pregos! “Papai, para que isto?”, perguntou decepcionado e confuso. “Filho”, disse o pai, “cada vez que agir com raiva, você vai colocar um prego nesta porta!”, ordenou incisivo.

 

E assim o menino passou a fazer. No primeiro dia, martelou cinco pregos, e seu pai o aconselhou a ser mais calmo. Nos dias e semanas que se seguiram, o garoto foi aprendendo a se controlar e o número de pregos diminuiu. Depois de muitos dias e de muitos pregos, finalmente o menino não ficou com raiva nem uma única vez naquele dia, e foi correndo contar para o pai, que disse: “Muito bem, meu filho, agora que você aprendeu a se controlar, arranque todos os pregos da porta.” Sem entender, mas obediente, o menino arrancou-os um a um, e depois parou um instante e viu como o aspecto da porta havia piorado: “Puxa, pai, como a porta ficou feia, toda esburacada” disse ele, ao que o pai observou pensativo: “Meu filho, quando agimos movidos pela raiva, é assim que muitas vezes deixamos os corações das pessoas e os nossos, cheios de ferimentos profundos, que se tornam cicatrizes difíceis de apagar.” 

 

Domínio próprio é fruto do Espírito Santo, e só é possível ser produzido em nós se estamos em Cristo, como Ele mesmo assegura em João 15.5: Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer”. Domínio próprio significa literalmente controlar a si mesmo, porque a nossa vida deve ser disciplinada, plena de autoconsciência e empatia, livre de descontrole emocional, ira, luxúria, paixões e mau gênio, atitudes que Deus desaprova e que são pecaminosas, por isso o verdadeiro cristão deve ter autodomínio em todas as circunstâncias de sua vida.

 

Por vezes permitimos que o emocional assuma o controle de nossas atitudes em família, no trabalho, no trânsito, e então ecoamos as palavras de Paulo em Romanos 7.19-20, confessando lamentoso: Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço. Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim.”

 

Nosso exemplo mais perfeito de domínio próprio é Jesus, o nosso modelo máximo, que ensina em Mateus 5.39-40: “… a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra…”. Que magnífica atitude de humildade e domínio próprio do Filho de Deus, mostrando que sem humildade não pode haver verdadeiro domínio próprio! Uma pessoa arrogante, orgulhosa, soberba, dificilmente poderá ter domínio próprio, porque se julga superior, a única que está sempre certa, considerando-se até acima do bem e do mal.

 

Em Provérbios 25.28, Salomão escreveu que “Como cidade derribada, que não tem muros, assim é o homem que não tem domínio próprio, mostrando que uma pessoa sem domínio próprio torna-se presa fácil do inimigo porque quando atacada não tem nada que a defenda e proteja, deixando-se assim dominar por seus desejos e impulsos, e ilustra a total vulnerabilidade da pessoa nesta condição: tudo o que é bom sai e a abandona, enquanto que tudo o que é mau a invade e toma conta.

 

O domínio próprio é uma virtude essencial que compõe o bom caráter de alguém que é sábio e virtuoso, que tem controle sobre o seu próprio espírito e sobre seus apetites e paixões, não dando liberdade para que eles se rebelem contra a razão, o bom senso e a consciência; aquele que o possui não se permite descontrolar emocionalmente porque tem poder sobre os seus próprios pensamentos, desejos, tendências e ressentimentos, não tolerando ser dominado por más influências ao atender à ponderada advertência do apóstolo em 1 Pedro 5.8: “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar…”.

 

Quem tem domínio próprio conduz-se pelos princípios contidos na Palavra de Deus, e guiado por ela planeja, toma decisões e orienta a sua vida, por isso é alguém capacitado a controlar o seu corpo e a sua mente, não permitindo que a carne domine, mas sim seu espírito fundado nas verdades de Deus. Quem não tem domínio próprio não é capaz de se controlar, e na verdade ele é que é controlado negativamente por circunstâncias, por atitudes, por gostos, por paixões, por modismos, por outras pessoas, pela midia, mas pouco por ela mesma.

 

A mente daquele que tem domínio próprio é totalmente voltada às coisas de Deus, àquilo que O agrada, por isso é uma mente obediente a Ele, ao mesmo tempo que é capaz de ter atitudes altamente benéficas, construtivas e positivas para quem a possui, assim pavimentando seu próprio caminho para a vida eterna.

 

Em 1 João 2.15-16 somos admoestados pelo apóstolo dizendo-nos que “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo”. Em síntese, tal como satanás se contrapõe a Cristo e a carne ao Espírito, o mundo é adversário do Pai, uma vez que a mundanidade é o amor pelas coisas efêmeras e só nas coisas de Deus, que são eternas, o coração humano encontra plena satisfação.

 

A concupiscência da carne é o anelo de prazeres sensuais, de desejo libidinoso, de luxúria, traduzindo-se por supervalorização e exposição indevida do corpo, prostituição, festividades mundanas, palavreado torpe, de baixo calão, ingestão de alimentos nocivos à saúde e em quantidade exagerada; a concupiscência dos olhos envolve tudo o que possa contribuir para afetar negativamente a nossa vida espiritual, como filmes sensuais e violentos, pornografia, leituras maléficas, enfim, tudo o que atrai para a mundanidade e que, portanto, é incompatível com quem almeja a cidadania celestial; a soberba da vida, que se revela pela obsessão com nível social, por complexo de superioridade ou até como tentativa de superar insegurança, medo e sentimento de inferioridade, manifesta-se por meio de orgulho, arrogância e presunção que leva a menosprezar o outro para elevar-se a si próprio. Tudo isso demonstra cabalmente uma coisa: falta de domínio próprio.

 

Há alguns inimigos poderosos contra os quais temos que lutar permanentemente em nossa vida: os pensamentos, os sentimentos, os desejos e as circunstâncias, e para ter domínio próprio dependemos de nossa capacidade de controlá-los, pois as decisões que tomamos e as ações que empreendemos decorrem deles. Contra eles temos que ter firmemente gravados na mente e no coração os princípios bíblicos que devem balizar a nossa peregrinação na terra. Somente firmados em Cristo, orando para fazer em tudo a Sua vontade, é que estaremos capacitados a decidir – com sabedoria em cada circunstância – o que fazer e o que não fazer.

 

Ter domínio próprio é não amar o mundo nem as coisas que existem no mundo – mas sim sempre fazer tudo o que agrada a Deus, obedecendo-O sem titubear em todas as circunstâncias. Por isso, a transformação, ou seja, a busca de maior semelhança a Cristo é o que alguns cristãos, em toda a história da fé cristã têm procurado, e entre os mais notórios está Thomas de Kempis, nascido em Kempen, Alemanha, por volta de 1379. Era mestre dos noviços no mosteiro onde havia ingressado e uma de suas funções era instruir no espírito os novos membros da comunidade, assim como a outros cristãos, e com esse objetivo escreveu um livro emblemático, A Imitação de Cristo, que enfatiza a essencialidade de reproduzir fielmente a Cristo em nossa vida.

 

Entre suas muitas e preciosas orientações, no Capítulo 3 do Livro II, que trata Do homem bom e pacífico, é importante ressaltar algumas que bem cabem àquele que deseja, – ou precisa, – ter domínio próprio:

  1. Primeiro conserva-te em paz e depois poderás pacificar os outros. Quem está em boa paz de ninguém desconfia; o descontente e perturbado, porém, é afligido de várias suspeitas e não sossega, nem deixa os outros sossegarem; diz muitas vezes o que não devia dizer, e deixa de fazer o que mais lhe conviria; atende às obrigações alheias e descuida-se das próprias.

  2. Bem sabes desculpar e cobrir tuas faltas, e não queres aceitar as desculpas dos outros! Mais justo fora que te acusasses a ti e escusasses o teu irmão; suporta os outros, se queres que te suportem; não é grande coisa conviver com homens bons e mansos, porque isso, naturalmente, agrada a todos, e cada um gosta de viver em paz e ama os que são de seu parecer; viver, porém, em paz com pessoas ásperas, perversas e mal educadas que nos contrariam, é grande graça e ação louvável e varonil.

  3. Uns há que têm paz consigo e com os demais; e há outros que não têm paz nem a deixam aos demais, são insuportáveis aos outros, e ainda mais o são a si mesmos; e há outros que têm paz consigo e procuram-na para os demais; toda a nossa paz, porém, nesta vida miserável, consiste mais na humilde resignação, que em não sentir as contrariedades; quem melhor sabe sofrer maior paz terá; esse é o vencedor de si mesmo e senhor do mundo, amigo de Cristo e herdeiro do céu.

 

Amado Pai, que a Tua Palavra da verdade esteja sempre em nossos corações, mentes e espíritos, brotando de nossos lábios e guiando nossas atitudes no mundo para que não caiamos nas armadilhas que o diabo tem preparadas para todos os que se descuidam da submissão a Ti, da obediência aos Teus preceitos soberanos e perfeitos, fazendo-nos perder o domínio próprio, e assim pecando contra Ti. Dá-nos, Senhor, discernimento para, em qualquer circunstância, e em especial nas mais difíceis, ouvirmos a Tua voz dando-nos a paz, a segurança e o discernimento de que necessitamos cada vez que formos tentados, desafiados e atacados. É no nome poderoso, santo e incomparável de Jesus que oramos e agradecemos. Amém.

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