Textos Louco Amor

ATÉ AOS CONFINS DA TERRA

O dr. Samuel Zwemer foi um grande missionário para o mundo árabe, conhecido como o Apóstolo do Islã, e nunca perdia uma oportunidade de pregar sobre Jesus aos árabes. Certa vez anunciava o Senhor Jesus para as pessoas na  sala de espera de um hospital da Arábia, e após ter encerrado sua pregação um beduíno que viajara 800 quilômetros para um tratamento, pediu a palavra e lhe disse: “Eu compreendo tudo que você nos falou porque eu conheci pessoalmente este homem. Ele era um tanto estranho. Quando as pessoas o agrediam com ofensas ele não revidava nem buscava vingança. Continuava cuidando dos enfermos, dos presidiários e  de todos que enfrentavam dificuldades. Ele tratava bem a todos e dizia que todos eram bons. Ele viajava distâncias imensas debaixo de sol causticante apenas para ajudar as pessoas. Ele era tudo o que você disse.” Então o dr. Zwemer percebeu que aquele de quem o árabe estava falando era Peter Zwemer, seu próprio irmão, que tinha também, anos antes, começado um trabalho missionário na Arábia. Embora não tivesse vivido para ver os resultados, Peter foi um exemplo de cristão que revelou Cristo através de sua própria vida de amor pelo próximo.

 

E quanto a nós? Que tipo de rastro temos deixado nos caminhos por onde passamos? Que sinais, lembranças e marcas têm permanecido nos locais onde moramos, estudamos e trabalhamos? Se nossos conhecidos fossem encorajados a nos retratar, de que se lembrariam?  Como seríamos descritos? Jesus seria visto em nós? A melhor maneira de refletirmos a pessoa de Jesus é através de uma vida santa e consagrada, praticando os Seus ensinos e deixando-O agir em nossas atitudes. As pessoas no mundo precisam ver em nós aquilo que ensinamos e pregamos. Só assim poderão constatar que somos verdadeiramente filhos de Deus, discípulos e imitadores de Cristo, servos obedientes ao Seu Ide em Mateus 28.19, e adequadamente instrumentalizados pelo que Ele anunciou em Atos 1.8: mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra”.

 

E como poderemos empreender tão extraordinária e desafiadora empreitada de ir “… até aos confins da terra” testemunhando de Cristo? Pelo menos de três maneiras:

 

1. Fisicamente  

 

Deixando tudo para trás: trabalho secular, amigos, parentes, namoro, noivado ou qualquer outro compromisso presente e/ou futuro – para falar de Cristo em um lugar desconhecido, – porque fomos chamados. Muitos foram e muitos estão indo para outras nações até aos confins da terra, e Paulo é um exemplo marcante da convocação irresistível do Senhor: no livro de Atos as passagens de 7.58 e 8.1,3, ainda como Saulo, mostra que ele fazia parte daqueles que participavam do cruel e covarde martírio de Estêvão; surpreendentemente contudo, a passagem de Atos 9.1-30 registra sua conversão após o tremendo episódio na estrada de Damasco, com o seu chamado pessoal por Jesus; então Atos 13 coroa a sua convocação por Deus, descrevendo a sua primeira viagem missionária, revelando uma transformação espiritual maravilhosa que só o Senhor poderia ter idealizado e consumado de forma tão extraordinária!

 

2. Evangelizando onde estamos e orando por missões

 

Embora muitos cristãos provavelmente sintam-se motivados a ir a outros povos para pregar a Cristo, nem todos conseguem realizar esse sonho por múltiplas razões, porém todos – sem exceção – estão aptos a obedecer ao “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo…”, que Jesus em Mateus 28.19 ordena, e foi esta a Grande Comissão que o Senhor nos outorgou. A bem da verdade o mundo todo é um grande campo missionário e devemos falar de Jesus e pregar a Palavra que liberta e transforma onde quer que estejamos: no trabalho, na escola, na vizinhança, na academia de ginástica, no aeroporto, no avião, no ônibus, nas viagens, nos locais onde vamos em férias, e assim por diante. E com as novas tecnologias digitais que estão à nossa disposição, fazer missões pelas mídias sociais tornou-se também um poderoso instrumento de proclamação do Evangelho a muitas pessoas em muitos lugares.

 

E devemos também assumir um ministério de intercessão por aqueles que estão na linha de frente, em países próximos ou distantes, entre povos de outras culturas, línguas e crenças. Até mesmo Paulo, incumbido pelo próprio Cristo de ir e tendo este privilégio, não prescindia dos missionários intercessores, e isto fica patente na carta aos Efésios 6.17-20: “Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus; com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos e também por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez, fazer conhecido o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador em cadeias, para que, em Cristo, eu seja ousado para falar, como me cumpre fazê-lo”.

 

Portanto, a oração é uma poderosa ferramenta de fazer missões, e quando oramos fazemos parte de um grande contingente de missionários que intercedem em favor dos que estão nos campos de batalha espiritual. Muitos podem dizer que não podem ir, e realmente não podem; contudo, muitos também podem dizer: mas posso orar. Muitos dos que ouviram a Grande Comissão de Jesus não ultrapassaram os limites de Jerusalém, alguns chegaram até Samaria, outros não saíram dos limites da Judéia, e outros ainda puderam deixar tudo para ir aos confins da Terra. O que os fez iguais, é que todos cumpriram a Grande Comissão.

 

3. Através da contribuição

 

Contribuir com missões não é uma invenção da igreja dos nossos tempos, pois a igreja do primeiro século já sustentava seus missionários por meio de contribuições voluntárias. Como exemplo, em 2 Coríntios 9, Paulo faz um caloroso agradecimento aos membros da Igreja de Corinto pelas contribuições que faziam para os cristãos de Jerusalém, recomendando em 9.7-8: “Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria. Deus pode fazer-vos abundar em toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundeis em toda boa obra…”.

 

Como um excepcional exemplo de fervor missionário, a extraordinária e muito conhecida história dos morávios merece sempre ser relembrada por todos os cristãos. A Morávia é uma região da Europa central que compõe atualmente a parte oriental da República Checa. Com o seu zelo por Cristo, os morávios escreveram uma das páginas mais nobres das missões cristãs em todos os tempos, e nenhum grupo protestante teve maior consciência do dever missionário ou demonstrou tamanha consagração a esse serviço em proporção ao número de seus membros.  Seu grande líder inicial e incentivador na obra missionária foi o piedoso conde, teólogo e bispo da Igreja Morávia, Nikolaus Ludwig Von Zinzendorf (1700-1760).

 

Numa viagem a Copenhague para assistir à coroação do rei dinamarquês Cristiano VI, Zinzendorf conheceu alguns nativos convertidos das Índias Ocidentais e da Groenlândia que lhe pediram “o senhor não pode fazer alguma coisa para nos enviar missionários?”, e este pedido tocou-o profundamente.  O renascimento da Igreja Morávia, em maio de 1727, havia resultado em grande parte de uma poderosa ênfase na oração, e nos meses seguintes este espírito de oração tomou conta da pequena comunidade evangélica, a tal ponto que no dia 27 de agosto daquele ano 24 homens e 24 mulheres comprometeram-se a orar uma hora por dia de forma sequencial, de modo que, sem interrupção, sempre houve alguém orando por missões.

 

Essa “vigília de oração” motivou Zinzendorf e a comunidade morávia a tentarem alcançar mais vidas para Cristo. Seis meses após o início da vigília, o conde desafiou os companheiros a evangelizarem as Índias Ocidentais, a Groenlândia, a Turquia e a Lapônia, e no dia seguinte, 26 morávios se ofereceram como voluntários para as missões mundiais, não importava onde Deus desejasse levá-los. A vigília de oração prosseguiu sem interrupção, vinte e quatro horas por dia, durante mais de 100 anos, sendo que em 1792, sessenta e cinco anos após o início da vigília, a pequena comunidade morávia já havia enviado 300 missionários aos confins da terra.  Com seu heroísmo, apego às Escrituras e consagração a Deus, os morávios, embora pouco numerosos, exerceram uma forte influência espiritual sobre outros grupos e movimentos protestantes, especialmente na Inglaterra.

 

Em 1832 já havia 42 campos missionárias morávios ao redor do mundo, todos mostrando uma característica do trabalho morávio: em geral eram locais difíceis e inóspitos, exigindo paciência e dedicação especial, traço que até hoje caracteriza o trabalho missionário desse grupo, cujo  lema missionário que  assumiam deixava isso ainda mais claro: “Conquistar para o Cordeiro a recompensa de seu sacrifício”.

 

A convivência com alguns morávios causou profundo impacto em John Wesley e contribuiu para a sua conversão e o surgimento do metodismo; William Carey, o pioneiro das missões batistas, os admirava grandemente e apelou para o seu exemplo de obediência. Eles também inspiraram a criação de duas das primeiras agências protestantes de missões – a Sociedade Missionária de Londres (1795) e a Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira (1804).

 

Paulo, em 1 Coríntios 9.23, revela que o motivo para a igreja fazer missões deve ser o próprio Senhor Jesus Cristo, afirmando: Tudo faço por causa do evangelho, com o fim de me tornar cooperador com ele. Evangelho é, ao mesmo tempo, a mensagem e o conteúdo da mensagem, ou seja, o Evangelho é o próprio Jesus Cristo. Fazer missões é salvar os perdidos, é obediência à ordem de Jesus, é ação para transformar o mundo. Mas precisamos ser movidos, acima de tudo, por um sentimento de gratidão pelo que Cristo é e por tudo que Ele fez em nosso favor, por isso devemos fazer missões para anunciar Aquele que deu a vida e ressuscitou por nós.

 

O apóstolo Paulo percorreu o mundo da sua época pregando o evangelho, e em 1 Coríntios 9.16 nos constrange: “Se anuncio o evangelho, não tenho de que me gloriar, pois sobre mim pesa essa obrigação; porque ai de mim se não pregar o evangelho!” Charles Spurgeon, por sua vez, afirmou categoricamente: “Todo cristão ou é um missionário ou um impostor”. E nós, o que somos? O que estamos dispostos a fazer por amor a Cristo? Estamos conscientes de que temos a responsabilidade de fazer tudo que estiver ao nosso alcance para que o Evangelho seja pregado em todo o mundo?

 

Senhor nosso Deus, numa sociedade em que as pessoas estão dando suas vidas por causas que não se justificam, por valores que não são os Teus, Pai, por questões materiais que nada constroem para a Tua causa, por outras coisas que embora espirituais não são Tuas, é em Cristo, por Cristo e para Cristo que estamos dispostos a ir até onde Tu nos conduzires, até aos confins da terra guiados por Ti, amparados por Ti, capacitados por Ti! Sensibiliza-nos, fortalece-nos, unge-nos, pois, Senhor, para sermos Teus servos bons, obedientes e úteis. É no nome santo de Jesus que assim oramos agradecidos. Amém.

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George Müller

As semelhanças entre a juventude de George Müller e a parábola do Filho Pródigo são notáveis, fato pouco percebido por muitos escritores e comentaristas.

Em 1810 sua família mudou-se da aldeia prussiana de Kroppenstaedt para as redondezas de Heimersleben, a quatro milhas de distância. George e seu irmão não tiveram nenhum tipo de controle familiar, e o seu pai, sendo muito generoso, dava-lhes fartas mesadas e apenas os encorajava a manter anotações de seus gastos.

George Müller adquirira o mau costume de roubar o dinheiro do pai: invariavelmente quando fazia dívidas em nome dele, ao pagar acertava bem menos do que devia, e seu pai por muitas vezes teve de pagar o dinheiro que faltava. Em uma ocasião foi pego em flagrante, mas mesmo assim não se emendava.

George foi matriculado em uma escola clássica em Halberstaedt para se tornar clérigo luterano, mas apesar de ser um aluno brilhante, continuava no caminho dos pecadores e o vício de furtar tornou-se uma compulsão. Certa vez teve um período notável de enganações e mentiras, quando ia de hotel em hotel, muitas vezes em companhia de mulheres, vivendo uma vida de playboy, mas sem dinheiro. Depois de penhorar posses valiosas e deixar o resto de seus pertences como garantia em um hotel, a lei o alcançou e ele foi parar na prisão, porém mesmo na prisão continuava a contar as mais incríveis mentiras para impressionar outros colegas presos.

Depois de um mês na prisão, seu pai pagou a fiança e o livrou, pagou suas dívidas e lhe deu uma surra. Durante algum tempo George Müller procurou agradar o pai, tentando modificar suas atitudes. Não foi longe, contudo, e logo estava novamente cheio de dívidas, e desta vez inventou uma história de que fora roubado e que seus amigos o ajudaram. A última escorregada veio quando ele estudava teologia na Universidade de Halle. Junto com outros três colegas, forjaram papéis e documentos e foram gozar férias de prazer mundano na Suíça. Lá, George Müller conseguiu também enganar seus amigos: ao pagar a conta de todos, cuidou para que sua parte ficasse menor em um terço.

Depois das férias na Suíça, Beta, um velho amigo e colega de classe, falou-lhe de um culto que muitas vezes frequentava, e George exprimiu o desejo de ir. E foi naquela reunião que Deus mudou sua vida para sempre. João 3:16 ensina: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. E Deus agradou-se de ensinar a George Müller algo sobre esta preciosa verdade. A conversão de George Müller, em novembro de 1825, foi dramática e imediata, mudando inteiramente seu modo de viver, objetivos e direção na vida.

Ele foi levado ao culto pelo amigo Beta e na sua entrada foi cumprimentado com um venha sempre que quiser, esta casa e nosso coração estão abertos para você. Estas boas-vindas lhe tocaram muito. O hinos cantados, o estudo bíblico e a leitura do sermão produziram nele uma profunda impressão, e naquela noite sentiu que encontraria “algo” pelo qual estivera procurando por toda a vida.

O amor genuíno, a grande alegria e a humildade profunda nos corações dos membros daquele grupo, tiveram um grande impacto em George Muller, mas é possível que o ponto de conversão tenha ocorrido quando todos se ajoelharam para orar. Ele nunca tinha feito isso antes, e durante o culto inteiro respirou uma atmosfera tão espiritual que sentiu que passava por uma experiência inteiramente nova. Então se converteu e nasceu de novo! Aquele caráter ocioso e preguiçoso já era parte do passado, e de joelhos, estava agora apenas um novo discípulo do Deus Vivo. Tempos depois comentou sobre aquele encontro: “Ali entendi a razão por que o Senhor Jesus morreu na cruz e sofreu a agonia no Jardim do Getsêmane, levando sobre si a punição que era devida a nós, e que não podíamos carregar por nós mesmos. E por isso, compreendendo em parte o amor de Jesus pela minha alma, fui constrangido a amá-lo em troca.”


George Müller continuou seus estudos teológicos na Universidade de Halle, e depois de dois meses da sua conversão à fé cristã, decidiu se tornar missionário. Esta decisão irritou tanto seu pai que este o abandonou retirando todo seu suporte financeiro, levando o filho a depender exclusivamente de Deus.

Sem o sustento do pai, ficou sem um centavo, mas em depois de apresentar o problema para Deus, foi convidado a ensinar alemão para alguns professores americanos visitantes, e por isso ele recebeu muito mais do que na verdade necessitava.
O maior obstáculo que George Müller tinha que ultrapassar naquela época era a obtenção de um passaporte para se matricular em uma escola de treinamento de missões em Londres, porque teria que prestar o serviço militar. Depois de muito orar, continuou o processo de alistamento no exército, e ao fazer os exames médicos, foi dispensado do serviço por questões de saúde.

Então em 1829 seguiu para Londres, para a escola de treinamento em missões, onde iria trabalhar com judeus, mas depois de um breve tempo ficou seriamente doente e quase morreu. Durante sua recuperação em Devon, a vida de George Müller sofreu outra mudança de rumo. Conheceu Henry Craik, um escocês que se tornou seu amigo íntimo, e foi este calmo, devoto e erudito homem que o ensinou a necessidade de crer sinceramente e ser obediente à vontade de Deus. Depois de desistir da escola de missões para assumir compromissos de pregação, aceitou o pastorado de uma Igreja em Teignmouth com um ordenado de 50 libras anuais, certo de que Deus proveria todas as suas necessidades, desde que ele se colocasse inteiramente na Sua dependência. Daquele momento em diante, até a sua morte em 1898, George Müller cresceu em obediência e confiança em Deus sob todos os aspectos.

Com a ajuda de Henry Craik , tornou-se um grande conhecedor das escrituras, e durante este período de aprendizado observou que muitos pregadores falhavam ao comunicar as verdades do evangelho e tendiam a ler sermões escritos, sempre apologéticos, carentes de convicção e inspiração, e quando começou a pregar a Palavra de Deus de uma maneira direta, dinâmica e sem rodeios, foi continuamente encorajado pela resposta de muitos ouvintes e pelo crescente número de conversões, a despeito do fato de  muitos reagirem energicamente contra sua abordagem direta.

Em 1830, George Müller casou-se com Mary Groves, que se tornou uma verdadeira auxiliadora e apoio para os anos de desafios que viriam a seguir. Henry Craik já estava em Bristol quando escreveu para seu melhor amigo convidando-o para mudar para lá, e George sentiu que uma chamada de Deus. Assim, em 1932 ele e Mary Müller partiram de Devon  para Bristol, onde Deus tinha um plano preparado para seu agora servo fiel.

Chegando a Bristol, George orou pedindo a Deus 1.000 libras e as pessoas certas para dirigir um Lar de Órfãos, e em cinco meses seu pedido foi atendido. Mary, junto com suas amigas, começaram então a mobiliar o primeiro Lar na Rua Wilson para acomodar trinta meninas, e logo depois mais três casas na mesma rua foram preparadas para abrigar mais 130 crianças. Em 1845, quando a demanda aumentou exponencialmente, George percebeu a necessidade de estabelecer um propósito para construir uma casa para acomodar 300 crianças, mas este projeto requeria a soma de 10.000 libras. Uma vez mais as orações de George Müller foram respondidas, os fundos necessários foram providenciados, e então ele comprou um sítio na área rural de Ashley Down, fora dos limites da cidade, bem abaixo do preço inicialmente pedido onde, em 1849, foi inaugurado o Lar para 300 crianças.

Por volta de 1870 havia um total de cinco casas em Ashley Down, valendo 100.000 libras e abrigando mais de 2.000 crianças. Todo o dinheiro e os funcionários vieram como resultado direto de oração, sem que George tenha contraído nenhuma dívida e sem nenhum apelo ou pedido.

Durante mais de sessenta anos de ministério, Müller criou 117 escolas que educaram mais de 120.000 jovens e órfãos, distribuiu 275.000 Bíblias completas em diferentes idiomas, além de grande quantidade de porções menores, sustentou 189 missionários em outros países, e sua equipe de assistentes chegou a contar com 112 pessoas.

Baseado em texto da The George Müller Foundation
Tradução de João Cruzué

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Inácio de Antioquia

Inácio foi discípulo dos apóstolos Pedro e João, e aprendeu com estes mestres competentes a sublime verdade do amor de Deus, que fez dele um dos pilares da Igreja Primitiva. Depois dos apóstolos, foi um dos homens mais notáveis do cristianismo nascente, e seus contem­porâneos e os que viveram nos três séculos seguintes, mencionam-lhe o nome com muita reverência.

Após mais de cinquenta anos no episcopado de Antioquia, aprouve ao Todo-Poderoso chamá-lo a receber sua coroa, através de uma morte que deveria ser uma glória e um modelo para a Igreja. A história de seus labores e virtudes não foi escrita, mas todas as particularidades de sua morte foram registradas por testemunhas oculares e distribuída em várias igrejas. O documento original, escrito em grego, acha-se preservado, e foi publicado por Ruinart, em Paris, no ano de 1690.

A cena de seu martírio começa no ano 107 de nossa era. O imperador Trajano tinha nas mãos o cetro dos césares, e Evaristo sentava-se na cadeira do papa. Relatam os historiadores que Trajano não amava naturalmente o derramamento de sangue, e que possuía um sentimento de humanidade mais nobre que todos os imperadores que o precederam. Era, no entanto, covarde e escravo da opinião pública, e reprimia os próprios sentimentos para favorecer o gosto brutal da plebe. A fim de ganhar popularidade, e sob o pretexto de devoção aos deuses do Império, dava continuidade, de tempos em tempos, às horríveis cenas de perseguição aos inofensivos cristãos, e Inácio foi uma de suas vítimas.

Chegando a Antioquia, Trajano ameaçou com severas punições todos aqueles que não sacrificavam aos deuses. Os labores e as pregações do venerável bispo da cidade fora tão coroado de sucesso, que a Igreja florescera, e deixara de ser uma desprezível comunidade de uns poucos indivíduos. Os pagãos viam com maus olhos este crescimento, e aproveitaram a presença do imperador para pedir sua extinção. “O magnânimo campeão de Jesus Cristo” dizem os Atos de Inácio, “receando que sua igreja se transformasse num cenário de massacre, voluntariamente entregou-se em suas mãos, para que saciassem nele a sua fúria, salvando assim o rebanho”‘.

Inácio foi conduzido à presença do imperador, e acusado de ser o cabeça e promotor do cristianismo na cidade. Trajano, assumindo um tom arrogante e desdenhoso, dirigiu-se ao idoso bispo, que se mantinha destemido perante ele, com estas palavras: “Quem és tu. espírito ímpio e mau, que te atreves não somente a transgredir nossas ordens, mas também a aplicar-te em carregar outros contigo para um fim miserável?” Meigamente, Inácio replicou: “Os espíritos ímpios e perniciosos pertencem ao inferno, nada têm a ver com o cristianismo. Tu não podes chamar-me de ímpio e mau. quando levo no coração o Deus verdadeiro. Os demônios tremem à simples presença dos servos do Deus a quem adoramos. Eu tenho Jesus Cristo, o Senhor universal e celestial, e Rei dos reis. Pelo seu poder, posso pisar todo o poder dos espíritos infernais.” “E quem é que possui e carrega seu Deus no coração?”, indagou Trajano. “Todos os que creem no Senhor Jesus Cristo, e o servem fielmente”, foi a resposta do homem santo. “Então não acreditas que também carregamos dentro de nós os nossos deuses imortais? Não vês como eles nos favorecem com o seu auxílio, e que grande e gloriosa vitória temos obtido sobre os nossos inimigos?” “Vós estais enganados ao chamar de deuses aquelas coisas que adorais”, replicou Inácio, majestosamente. “Eles são espíritos amaldiçoados, são demônios. O Deus verdadeiro é apenas um, e foi Ele quem criou os céus, a terra, e o mar, e tudo o que existe. E apenas um é Jesus Cristo, o Filho primogênito do Deus Altíssimo, e a Ele eu oro humildemente, para levar-me um dia à possessão do seu reino eterno.” “Quem é este Jesus Cristo? Não é Ele que foi posto à morte por Pôncio Pilatos?” “É dele que eu falo”, respondeu Inácio. “Ele, que foi cravado na cruz, que aniquilou o meu pecado e o inventor do pecado, e que, pela sua morte, pôs sob os pés daqueles que devotamente o levam no coração, todo o poder e malícia dos demônios.” “Então carregas dentro de ti este Jesus crucificado?”, perguntou o imperador com um sorriso sarcástico. “Assim é”, afirmou Inácio.  “Porque Ele nos diz em sua santa Escritura: ‘Neles habitarei e andarei entre eles’” (2 Coríntios 6.16).

Por um momento, Trajano silenciou, pensamentos conflitantes passavam-lhe pela mente. Estava ansioso para ouvir mais sobre a religião dos cristãos, e tocado pela venerável aparência do servo de Cristo, esteve para mandá-lo de volta ao seu povo com uma leve reprimenda, mas o demônio do orgulho e da infidelidade levantou-se de um salto em seu coração, e recordou-lhe que qualquer parcialidade para com a seita odiada, seria um sinal de fraqueza, uma perda de popularidade, e uma falta de lealdade aos deuses. Ademais, a hesitação trairia o falso zelo de seu coração hipócrita, então, sentando-se no trono, pronunciou a sentença contra o bispo de Antioquia: “Ordenamos que Inácio, que afirma carregar consigo o Jesus crucificado, seja levado em cadeias à grande cidade de Roma, e em meio aos jogos do anfiteatro, como um prazeroso espetáculo ao povo romano, seja dado em alimento ás bestas-feras.”
Quando Inácio ouviu sua sentença, caiu de joelhos, e erguendo os braços ao céu, bradou num êxtase de alegria: “Oh. Senhor, agradeço-te haver-me honrado com o mais precioso sinal da tua caridade, e permitido que eu seja acorrentado por teu amor, como foi o apóstolo Paulo.”
Ele permaneceu na mesma posição, os braços levantados, os olhos fixos no céu. Parecia haver tido um vislumbre daquela inefável alegria que tão ardentemente desejava, e que logo desfrutaria. Foi arrancado de seu devaneio pelas garras de um soldado que agarrou-lhe a frágil mão, e a prendeu numa algema como a um criminoso. Ele não ofereceu resistência: cheio de alegria, e orando por seu pobre rebanho, foi com os guardas para uma das celas da prisão pública, onde aguardaria a partida para Roma.

Entretanto, a Divina Providência, que pode tirar o bem das más ações humanas, destinou essa jornada à edificação da Igreja e à salvação de inúmeras almas. A constância, a piedade, e a eloquência do mártir em seu caminho para a morte espalharam amplamente a sublime verdade da lei divina, e ele despejava de seu coração o fogo do amor que queimava dentro de si. Por onde passava, os cristãos eram animados a um novo fervor, e muitos infiéis reconheceram no respeitável prelado um reflexo da divindade do evangelho que ele pregava, e abjurando os falsos deuses do paganis­mo, tornavam-se filhos de Deus.
Não resta dúvida de que ele sofreu muito em sua longa e tediosa jornada a Roma, que deve ter levado mais de seis meses. Muitos dos cristãos ouviram falar da chegada de Inácio, e foram encontrá-lo num lugar próximo de onde agora se vê a imponente igreja de São Paulo. Saudado com uma mistura de alegria e tristeza, alguns estavam maravilhados de ver o venerável pastor e receber sua última bênção; outros choravam cm voz alta a tristeza de saber que aquele grande homem ser-lhes-ia tirado por uma morte ignominiosa. Ele os consolava com a alegria de seu próprio coração, e tornava a implorar-lhes que não lhe evitassem o sacrifício com suas orações.

Enquanto Inácio absorvia-se em oração, uma breve curva na estrada trouxe-os para dentro da visão do poderoso Coliseu, do deslumbrante vestígio do palácio dourado de Nero, que coroava o Palatino, e à distância, dos templos imponentes do Capitólio. Ao mesmo tempo, ouviram o troar de alguns milhares de vozes, misturadas aos rugidos dos leões e das outras feras. Percorrera a multidão o rumor de que um dos líderes dos cristãos havia sido trazido da Síria, e condenado, por ordens do imperador, a ser exposto às feras. Um frenesi selvagem vai passando de banco para banco, o anfiteatro inteiro levanta-se e solta o grito coletivo, pedindo que os cristãos sejam lançados aos leões. Repentinamente, a calma reina sobre as massas vivas, e todos os olhos fixam-se num dos portões de onde vêm os soldados conduzindo à arena um homem idoso e fraco, que é colocado então de joelhos, braços cruzados sobre o peito, olhos erguidos ao céu, esperando calma e resignadamente o momento que deveria libertá-lo desta vida, lançando-lhe a alma em seu voo para a eternidade. Mais um momento, e os pequenos portões das passagens subterrâneas se abrem, e dois leões saltam para a arena.
Um silêncio palpável reina no anfiteatro. As feras avançam… Basta. Deixemos que a imagina­ção complete os detalhes angustiantes. A noite caiu sobre a cidade, e o Coliseu está silencioso como uma tumba. À fraca luz do luar, três homens caminham rápida e silenciosamente à sombra das arcadas. Na arena, próximo a um dos lados da arquibancada do imperador, abaixam-se e desdobram um pano, onde recolhem alguns ossos e uma porção de areia empapada de sangue. São os cristãos Carus, Philom, e Agathopus, que acompanharam Inácio desde a Antioquia. Próximo dali, há uma casa frequentada pelos cristãos. É a casa de Clemente, discípulo de Pedro, para onde os três amigos levam os restos mortais do querido pastor, e prestam-lhe as homenagens fúnebres.

Extraído de texto de autoria do pastor Josemar Bessa.

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